Crimes online entre crianças e jovens em Portugal: o que está a acontecer e quais são os seus direitos
- IKIGAI - Equilíbrio Digital
- há 6 dias
- 3 min de leitura

A Internet é hoje parte inseparável da vida das crianças e jovens. É onde estudam, socializam, se divertem — mas também onde, cada vez mais, sofrem agressões e violência. Em 2024, a APAV registou 681 pedidos de ajuda por crimes digitais, muitos dos quais envolveram menores de idade (mais 12 % do que em 2023); 39 desses casos envolveram crimes sexuais contra crianças e 268 denúncias abrangeram discurso de ódio. No universo escolar, um inquérito nacional divulgado em abril de 2025 mostra que 1 em cada 16 crianças entre os 11 e os 18 anos em Portugal declararam ter sido vítimas de cyberbullying nos meses anteriores.
Estas situações vão desde ameaças e humilhações em grupo, à partilha de imagens íntimas sem consentimento, à exposição de imagens manipuladas por IA (deepfakes), passando por discurso de ódio com base na identidade de género, cor da pele ou orientação sexual. Estes números confirmam que a violência digital, apesar de invisível aos olhos dos adultos, tem impacto concreto na saúde mental, no rendimento académico e na segurança dos menores.
O que diz a lei?
Nos últimos anos, a legislação portuguesa tem-se adaptado:
Lei 26/2023, de 30 de maio – introduziu o novo art.º 193.º (“Devassa através da Internet”), elevando para 5 anos a moldura penal da disseminação de imagens íntimas sem consentimento, e agravou as penas no art.º 192.º para captação ou divulgação de imagem íntima.
Lei 4/2024, de 15 de janeiro – alargou o art.º 240.º a novas bases de discriminação (identidade ou expressão de género, características sexuais, deficiência), reforçando o combate ao discurso de ódio online. Dados oficiais apontam para um aumento de 38 % destes crimes em 2024.
Decreto‑Lei 20‑B/2024 – designou a ANACOM como Coordenador dos Serviços Digitais, operacionalizando o Digital Services Act (DSA) em Portugal e criando um canal rápido de ordens de remoção de conteúdos ilegais. Dessa forma, o novo Digital Services Act (DSA) obriga plataformas digitais a remover conteúdos ilegais rapidamente, sob risco de sanções.
Diretiva UE 2024/1385 – obriga todos os Estados‑Membros a criminalizar deepfakes sexuais não consentidos até abril de 2026.
E as vítimas? Que direitos têm?
O Estatuto da Vítima (Lei 130/2015) transpõe a Diretiva 2012/29/UE e confere a qualquer menor ou jovem vítima de crime online, bem como à sua família, os seguintes direitos essenciais:
Direito à informação acessível sobre o processo, os serviços de apoio e os prazos de queixa.
Direito a apoio especializado e confidencial – gratuito através da APAV, da Linha Internet Segura (800 21 90 90) ou das CPCJ quando há perigo atual para a criança.
Direito de participação no processo penal (constituição como assistente ou parte civil – art.º 67.º‑A CPP).
Direito a proteção (medidas de afastamento do agressor, anonimização de morada, sigilo processual).
Direito a indemnização: a via cível contra o autor ou, em crimes violentos, o recurso à Comissão de Proteção às Vítimas de Crimes (CPVC).
Direito ao apagamento de dados (“direito a ser esquecido”) previsto no art.º 17 do RGPD (Regulamento Geral de Proteção de Dados); a vítima pode exigir às plataformas a remoção de conteúdos e denunciar demora ao regulador nacional (CNPD). O DSA reforça esse mecanismo com prazos curtos de resposta.
O que fazer em caso de vitimação?
1. Recolher provas: capturas de ecrã com URL, data e hora, cabeçalho de e‑mail ou ID da publicação.
2. Denunciar:
PSP/GNR (presencial, via queixa‑eletrónica@mai.gov.pt ou www.internetsegura.pt) – é obrigatória a denúncia das autoridades ao Ministério Público para crimes públicos.
Linha Internet Segura/APAV – remoção expedita de pornografia infantil, discurso de ódio ou deepfake (www.apav.pt).
3. Solicitar remoção direta à plataforma citando art.º 193.º (conteúdo íntimo) ou art.º 240.º (ódio).
4. Apoio psicológico: as escolas podem acionar o SPO (Serviço de Psicologia e Orientação); em Faro, existe o projeto IKIGAI, com intervenção psicológica dirigida aos casos de ciber‑vitimação.
5. Compensação e reabilitação: orientação jurídica gratuita, grupos de apoio de pares e, quando aplicável, programas de educação digital para o agressor (medidas tutoriais educativas).
Proteger crianças e jovens no mundo digital é uma responsabilidade coletiva. A Internet pode ser uma ferramenta incrível, mas só se for segura. E para isso, é preciso estar atento, informado e ativo na defesa dos direitos das vítimas.
Para consultar mais informações: